segunda-feira, 15 de outubro de 2007

EU E O ANJO DA MORTE



Existe uma hora, ao final da tarde, em que as luzes e sombras começam a dançar, que seus limites ficam totalmente indivisíveis.
Neste momento é comum o ser humano ser tomado por uma sensação de melancolia.
Não sei se por um resquício atávico do medo da noite, quando ficávamos mais a mercê das feras noturnas e dos medos da imaginação, ou, talvez, simplesmente porque se deu conta que mais um dia, irrecuperavelmente, passou. Que o sentido do tempo é unidirecional e, seja para onde ele nos leve, nos aproximamos um pouco mais do ponto final da viagem.
Pois vivia eu todas estas sensações e sentimentos, sentado em cima de um tronco de árvore, observando os sinais da vida diurna que se esfoliava quando o vi.

Escuro, negro diria, seu rosto eram todos os rostos. Sorridente, benevolente, belo, sarcástico, maldoso, ferino, angustiado, apavorado, aparvalhado, estupefato, mordaz, assustado, dolorido, sereno; enfim, todas as formas possíveis que um rosto pode mostrar quando abandona este estado que chamamos de Vida.
Seu olhar frio e vazio parecia contemplar o nada ou a eternidade.
Durante alguns minutos ficamos a nos olhar. Ou melhor, eu fiquei a olha-lo, pois, definitivamente, não saberia dizer se ele olhava para mim.
Depois, lentamente, se levantou, deu-me as costas e murmurou.
- Ainda não é a hora.
E assim como chegara, foi-se.


Talvez alguém, numa destas curiosidades pueris, tão comuns, me perguntaria se ele tinha asas. Total, dizem que os anjos têm asas. Mas para que anjos precisam de asas? São divinos, imateriais. Acho que somos nós quem precisa colocar-lhes as asas. Ele não tinha asas. Respondo sobre isto apenas para dirimir dúvidas e esclarecer definitivamente este ponto.
Meus agradecimentos ao meu amigo Paulo Burd (Querem um assessor de imprensa? Ele é o homem!) que me mostrou uns delitos que eu estava cometendo com o português.

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