sábado, 3 de novembro de 2007

AINDA FALTA ...

Lá estava eu refestelado num café, tomando um Black Love, que é uma mistura de café com chocolate meio amargo, quando chegou o meu Amigo.
Meu Amigo trazia estampado no rosto um ar de desconsolo que não tinha como se deixar passar desapercebido. Convidei-o a sentar comigo, coisa que ele aceitou de bom grado, acho até que esperava pelo convite.
Mas sentou e começou a falar. Vinha pela Goethe (Para quem não sabe, uma das principais avenidas de Porto Alegre, no, talvez, mais chic bairro da cidade.), quando parado em uma sinaleira, viu, uns dois carros adiante do seu, um motoqueiro e o dono de um Corolla conversando. Só que, perto do final da conversa, o dono do Corolla passou para o motoqueiro uma série de objetos.
Neste momento o garçom chegou e perguntou o que ele iria querer. Quase de má vontade, irritado pela interrupção, ele pediu um café simples, como se, simplesmente, quisesse se livrar do garçom.
Voltou de imediato ao assunto. Viu o homem entregando os objetos e, só aí, viu o revolver na mão do motoqueiro. Este arrancou rápido, dobrou na contramão e sumiu. Ninguém fez nada, embora o meu amigo tivesse certeza de que vários haviam visto o que ele havia visto. Comentou que, fosse ele o condutor do carro imediatamente atrás do assaltado, teria tentado dar uma arrancada e atropelado o meliante. Ou talvez só ficasse só na vontade, pois seria uma mancada fazer o que desejava, não só pelos riscos, como, principalmente, pelos incômodos que certamente teria com a burocracia. Isto sem falar no risco de uma eventual vingança.
Meu Amigo me informa que está indo para a Holanda fazer um curso de um ano. Já lá esteve por duas vezes. Fica pensando, às vezes, se não seria de ficar morando lá. Levaria a mulher, os filhos, seus pais, os de sua esposa já são falecidos.
Não agüenta mais a sensação de insegurança daqui. Todo o dia é um amigo, um conhecido, que conta uma história como a que ele hoje presenciou. Muitas vezes, até piores. Mas o pior, o pior de tudo, é que não vê nenhuma perspectiva de melhora.
Mas vai voltar. Gosta daqui, das pessoas, principalmente dos amigos. Não conseguiria viver sem seus amigos.
Ouço-o com o cuidado, carinho, atenção, que se deve escutar os que falam de suas doenças, dores e sofrimentos. Dou-lhe as respostas evasivas que se dá a alguém quando se pensa de modo semelhante; mas que se sabe que, simplesmente apoiar o que ele pensa, significa deixá-lo ainda mais sem perspectivas.
Devo dizer que duvido que as coisas venham a melhorar em curto prazo.
Falta-nos ainda a Indignação, a Ira, o Chega!. O acontecimento, ou acontecimentos, a Hecatombe que faz com que a gente mande os escrúpulos, os princípios, ao Diabo que os carregue.
Queremos mudar. Mas sem mudar muito. E nisto vamos tergiversando. Não queremos abrir mão de certos direitos, garantias, flexibilidades. O laisser fair nos é ainda caro... Já sofremos com a arbitrariedade, com a censura, com a falta de liberdade. Não sabemos ainda qual é o ponto de equilíbrio entre o direito de cada um e o direito de todos. Distinguir as defesas que um cidadão deve ter, daquelas que só servem para procrastinar a punição dos que tem Poder ou habilidade.
Simplesmente nos assusta a idéia de que venhamos a matar um monstro e criar um outro
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